Quando eu comecei a escrever pra Gazeta, tinha a intenção de apenas indicar livros neste espaço. Mas, em sua coluna da semana passada (18 de dezembro), Zauri Tiaraju de Castro falou sobre o seu “casulo”, o seu “lugarzinho imaginário” onde se aparta do mundo. Lendo-a, comecei a pensar no meu casulo: os livros. É mergulhando nas estórias que eu me aparto do mundo e viajo por lugares distantes. O que é uma benção nesse período pandêmico, em que a realidade nos sufoca e nos enche de ansiedade.

Mesmo com todo o caos de 2020, viajei muito – apesar de não tanto quanto gostaria –, estive em terras distantes e, obedecendo ao distanciamento social, estive rodeada de muitas pessoas e seres diversos. Mas como? Em minha dissertação de mestrado, “Os Dias Antigos da Terra-média: Bíblia e mitologia em O Silmarillion, de J. R. R. Tolkien”, quando falo da diferença entre o espaço e o tempo do leitor/ouvinte e o da estória, digo que abrir um livro é um ritual, pois, quando uma estória começa a ser lida ou contada, “o leitor/ouvinte interrompe sua vida cotidiana, muda de espaço – do Mundo Primário para o Mundo Secundário – e muda, também, de tempo, saindo do seu presente para o momento em que a narrativa se situa”. O Mundo Primário é o mundo do leitor, o nosso mundo, onde vivemos; o Secundário é o da estória, onde os fatos relatados se passam. E o que é sair de nosso mundo e mergulhar em outro se não empreender uma viagem?

Neste ano, entrei num buraco atrás de um coelho com Alice e vivi muitas aventuras no País das Maravilhas; viajei a lugares indescritíveis (nas palavras do próprio H. P. Lovecraft, apesar de ele gastar linhas e linhas descrevendo-os) em contos cheios de mistérios e traços mitológicos em H.P. Lovecraft: medo clássico; fiz uma viagem a outros mundos com Meg Murry, Charles Wallace e Calvin O’Keefe para resgatar o Pai na graphic novel Uma dobra no tempo (adaptação da obra homônima de Madeleine L’Engle); estive na Transilvânia e na Inglaterra com Conde Drácula e compartilhei da angústia de Jonathan Harker, Mina Murray, Dr. Seward e Dr. Van Helsing tentando matar o vampiro para salvar vidas; e estive no condado de Jefferson (Colorado – EUA) e compartilhei da indignação de seus habitantes com relação ao atentado de Columbine.

Mas a maior parte de 2020 eu passei na Terra-média, pois ainda estava escrevendo minha dissertação, e foi a melhor viagem que fiz no ano. Convivi com Valar, Maiar, elfos, anões e homens, e aprendi muito com eles durante as guerras contra um deus caído e seus exércitos saídos das profundezas da fortaleza de Utumno. Aliás, Melkor e seus servos refletem muito da humanidade (ou da falta dela nos homens do mundo real).

Agora, estou viajando por ilhas distantes na companhia dos personagens de Robert Louis Stevenson e ansiosa para conhecer Dr. Jekyll e seu duplo, Sr. Hyde. Mas mais ansiosa ainda estou para saber quem vou conhecer e a que mundos viajarei em 2021. E vocês, aonde irão? Respondam-me nas redes sociais.

 

Referências:

LARSON, Hope; L’ENGLE, Madeleine. Uma dobra no tempo. Adaptação e ilustrações: Hope Larson. Tradução: Érico Assis. Rio de Janeiro: Darkside Books, 2018. 392p.

LOVECRAFT, H. P. H.P. Lovecraft: medo clássico. Ilustrações: Walter Pax. Tradução: Ramon Mapa da Silva. Rio de Janeiro: Darkside Books, 2017. 416p.

OLIVEIRA, Isabela Brito. Os Dias Antigos da Terra-média: Bíblia e mitologias em O Silmarillion, de J. R. R. Tolkien. Orientador: Eduardo Marks de Marques. 2020. 125 f. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Letras) – Centro de Letras e Comunicação, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2020.

 

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