No dia a dia é que se percebe, por relatos de conhecidos, que a vida dos idosos não está nada fácil nesta pandemia. Os antigos donos de seus bens, da casa e do próprio nariz não se governam mais. Os filhos ou filhas casam, e os cônjuges não são parentes seus, só “agregados”. Sorte dos vovôs que acolheram bem os novos membros, os integraram à própria família e, na sua velhice, recebem a mesma atenção.

Mas, pelo que tenho ouvido nos últimos dias, são os próprios descendentes que devem a vida, a educação, o sustento e os cuidados aos pais que, agora com seus próprios compromissos, não conseguem recebê-los em suas casas. Os parceiros não os aceitam, ou é seu trabalho que os faz sair de casa e não conseguir cuidá-los como merecem.

É o caso de uma família que vive o jogo do empurra. Um filho tem a casa pequena, outro viaja seguido, outro precisa de sossego, ou é adoentado, ou não tem tempo para atendê-los. Acontece que a idosa em questão está com Alzheimer, mas, antes disso, ela já era difícil de lidar. Daquelas donas de casa que não admitem empregada ou acompanhante, porque não obedecem ao seu ritmo nem à maneira de administrar a morada. Já providenciaram uma acompanhante que pouco durou no trabalho.

Conheci outra senhora assim. Vivia de avental e de espanador. Os filhos não tinham liberdade de trocar móveis ou utensílios de lugar. E tinham que entrar sem calçados para não sujar os tapetes e o chão. Coitadinha, seus últimos dias foram muito tristes. Nem filhos, nem genro ou nora conseguiam ficar mais de um dia com ela.

Em compensação, há muitos velhinhos que deram o melhor de si quando ativos e, agora, são mal cuidados por sua prole. Às vezes com boa intenção – falta de tempo ou esquecimento –, os filhos se esquecem de surtir a despensa do pai, e ele fica dias sem os alimentos que mais fazem falta: leite, pão, frutas, hortaliças e até o arroz e o feijão.

Noutro caso, um filho folgado se ofereceu para morar com o pai, mas, em vez de melhorar a vida do velhinho, até do dinheirinho da aposentadoria ele se apropriou.

Pior ainda é quando os levam “de surpresa” para uma casa geriátrica, e lá o esquecem até receberem a notícia de sua morte.

Lembro-me de um miniconto da Globo que me tocou fundo. Um casal de idosos, morando em São Paulo, tinha duas filhas, ambas casadas, nos seus lares, preocupadas com os filhos, os empregos e o crescente custo de vida, que não permitiam a nenhuma delas levar os pais juntos para morar em suas casas. Fizeram então uma reunião de família e, diante dos pais, coitadinhos, resolveram que a moradora do Rio de Janeiro ia levar a mãe, e a outra ficaria com o pai em São Paulo. A tristeza daquele casalzinho que jamais se separara na vida, que se prometera permanecer juntos até que a morte os separasse, foi uma emoção que me abalou e não consigo esquecer. Porque pode estar acontecendo por aí.

Não dá para julgar ninguém nesses casos. Todos têm suas razões, mas a tristeza é de ver os idosos terem de abandonar suas casas, ou renunciar a seu comando, ficando reféns dos mais moços, que passam a governar suas vidas.

É a realidade, como fugir a ela? Minha sugestão é que ninguém se apegue demais aos bens materiais, suas casas, ou até modos de viver e manias, pois temos que estar abertos às mudanças, compreender quando nosso “reinado” já passou. E deixemo-nos levar, com carinho, pelas decisões de nossos filhos, pois filho que honra o quarto mandamento, só pode desejar nosso bem.