Por vezes, uma visão mais dura e realista sobre uma situação, ou mesmo o modo de vida de uma pessoa, pode nos render um maior aprendizado quando se trata de tutelar o mundo segundo a nossa visão interior quanto à nossa própria hierarquização dos valores pessoais, nosso ponto de vista, que nem sempre é a visão das outras pessoas.

Certa feita, dei uma carona para um caminhante que retornava para casa depois de uma semana no batente numa lavoura de arroz distante de onde vivia com a família, acampado num rancho coberto de macegas, na beira do mato. Puxei logo conversa e, depois de receber algumas respostas sintéticas, do tipo “sim e não”, monossilábicas, às perguntas que fiz ao desconfiado mochileiro, após seu desembarque na BR-290, bem próximo do Polentão, comentei com o meu irmão que viajava comigo:

– Coitado do cara, num serviço brabo desses, ganhando pouco, e ainda tendo de ir para casa a pé, debaixo dum sol escaldante, no pico do verão.

Meu irmão, que era um cético a respeito de quase tudo, perguntou se eu avaliava que havia ajudado o cara, dando uma carona episódica e diminuindo o tempo de chegada em casa daquele pobre vivente. Eu respondi que sim, já que havia lugar disponível no carro, não andava com pressa, e que aquilo não me custara nada. Então, ele contestou a minha boa intenção, sob o argumento de que aquele trabalhador era acostumado na lida braçal que enfrentava para sobreviver e, na segunda-feira, quando voltasse para o eito na lavoura, iria pelas próprias pernas, que aquela era sim a sua realidade, e que caronas tinham pouca valia para quem está habituado a caminhar a pé com peso no ombro. Seria a sua rotina de vida, sem reclamar, até porque sabia que nada iria alterar o seu modus vivendi simplório, a não ser pelas suas próprias mãos. Enfrentava a sua sina com resignação, embora até acreditasse na esperança de um dia melhorar com o fruto do seu labor.

Lembrei-me do tempo em que eu era guri lá fora, quando o cata-vento carregava uma bateria de seis volts, através de uma relé, para alimentar um rádio Telespark comprado de uns ciganos, pelo qual se sabia alguma novidade do mundo pelo Repórter Esso, e escutava a novela da tarde na Farroupilha. Quando a safra era frustrada e o dinheiro escasseava no bolso dos que não eram assalariados, meu pai dizia que havia de se dar um jeito, já que até os gatos, quando sentiam muita fome porque os ratos escasseavam no tempo de inverno, se desapertavam comendo laranja. Era mesmo a máxima de que “o que não tem solução, solucionado está”. Só não havendo mesmo jeito para a morte. Apesar de chorar o ente querido por uns poucos tempos, nos acostumamos com a sua ausência, e até nos sentimos reconfortados, recordando as suas lembranças boas e cultivando seus exemplos positivos que ficaram.

Assim é a vida, cada um na sua, limitado ao mundo que lhe é possível viver. E eu, cheio de compaixões e empatias, vivendo e aprendendo, sem jamais abrir mão dos meus velhos pontos de vista arraigados pela usura tortuosa dos caminhos percorridos. Mas cada um tem o seu…