A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Subseção Caçapava do Sul/Santana da Boa Vista divulgou uma nota sobre a falta de juízes titulares na Comarca. No documento, afirma que isso causa prejuízos ao andamento de processos e à população dos dois municípios.

Em entrevista à Gazeta, o presidente da Subseção da OAB, Antonio Almeida Filho, disse que a falta de magistrados titulares acarreta em acúmulo de audiências, que estão sendo feitas por substitutos na medida do possível. Segundo ele, estima-se que aproximadamente dois mil processos estão parados na 1ª Vara da Comarca e quatro mil na 2ª Vara.

Antonio Almeida Filho, presidente da Subseção da OAB

– Não há como marcar audiências com o juiz substituto devido à falta de tempo do próprio juiz para realizar as audiências. Ele está atendendo a outra Comarca como titular. Na 1ª Vara, o juiz substituto está fazendo algumas audiências mais urgentes; a 2ª Vara tem processos que estão represados há mais de dois anos. Quem acaba sendo prejudicado é o cidadão que está buscando o seu direito. Não é má vontade, não é incompetência, não é nada disso. Mas com a ausência de juízes, acaba represando, porque são eles que têm que fazer a audiência – declarou.

Também conforme o presidente da Subseção, com processos eletrônicos não há tanta dificuldade, pois os juízes podem despachar das Comarcas onde estão. Porém, há processos mais antigos, anteriores a 2019, que são físicos.

– Esses sofreram uma paralisação muito grande. Tivemos, no fim de 2019, a greve dos servidores da Justiça. Quando retornaram, veio o recesso do Judiciário, que acabou no final de janeiro de 2020. Em seguida, veio a pandemia. Quando houve a retomada dos prazos, teve o ataque hacker no sistema do Tribunal de Justiça. Isso prejudicou muito os jurisdicionados, que são os cidadãos que postulam o direito em juízo, e os advogados também, porque as pessoas cobram muito a gente. O que queremos passar para a comunidade é que não é culpa do advogado, a culpa é de várias circunstâncias que atingiram o sistema judiciário – explicou Antonio Almeida Filho.

Ainda de acordo com ele, a Subseção da OAB está organizando uma comitiva para participar de uma reunião com o presidente do Tribunal de Justiça do Estado (TJRS) e cobrar uma elevação de entrância, pois a Comarca local já tem um volume de processos suficiente para ser uma Vara de entrância intermediária. Nesse caso, os juízes ficariam entre cinco e seis anos na Comarca até serem promovidos. Foram convidados a integrar a comitiva os prefeitos de Caçapava, Giovani Amestoy (PDT), e de Santana, Garleno Alves da Silva (MDB), os presidentes das Câmaras de Vereadores das duas cidades, Paulo Pereira (PDT) e Evaldo da Rosa Melo (PP), e o presidente da OAB/RS, Ricardo Ferreira Breier.

Sobre o ofício enviado ao TJRS em 30 de setembro pedindo a designação de juízes titulares para a Comarca, Antonio Almeida Filho disse que já houve um retorno, e que o edital deve ser aberto em novembro. A expectativa é de que, entre dezembro e janeiro, ocorra a designação.

Enquanto não ocorre a elevação de entrância, deverá ser solicitado que, além dos dois juízes titulares, a Comarca também tenha um juiz designado para judicância compartilhada na 2ª Vara, de modo que haja dois juízes realizando as audiências desta Vara.

– A judicância compartilhada deve ajudar a desafogar os processos que estão na 2ª Vara – disse o presidente da Subseção.

 

Substitutos se desdobram para atender mais de uma Comarca

                                                     Diego Locatelli atua como substituto na Comarca local                                                                    Foto: Isabela Oliveira

O juiz substituto da 1ª Vara Judicial da Comarca, Diego Locatelli, diz que a situação não é exclusiva de Caçapava: há um déficit no número de juízes em todo o território nacional.

– Estima-se que, no Brasil, 20% das vagas de juiz não estão preenchidas. Na microrregião formada pelas Comarcas de Caçapava, Lavras e São Sepé, das cinco varas judiciais, apenas uma conta com juiz titular; em 2020, os outros quatro juízes, entre os quais me incluo, foram promovidos para a entrância intermediária, assumindo outras Comarcas – informou.

Quando isso ocorre, magistrados de outras Comarcas são designados provisoriamente até que a vaga seja preenchida, no chamado regime de substituição. Segundo Locatelli, nesses casos, os juízes acabam tendo trabalho dobrado, pois atuam tanto na Vara em que são titulares, quanto na Vara que estão substituindo.

– No caso de Caçapava, por exemplo, os juízes são titulares das Varas Judiciais de Dom Pedrito, mas respondem como substitutos na Comarca local. Durante o regime de substituição, é dada prioridade aos processos de maior urgência, como os que envolvem réus presos e crianças acolhidas. Uma vez por semana, os juízes substitutos, em dias diferentes, despacham presencialmente na Comarca. Além disso, no meu caso, também reservei mais um dia da semana para fazer audiências e sessões do Tribunal do Júri, computando dois dias úteis dedicados à Comarca de Caçapava. Fiz inclusive audiências de processos que tecnicamente não se enquadram como urgentes, o que é incomum em um regime de substituição. Isso não significa, porém, que nos demais dias da semana os juízes substitutos não trabalhem na Comarca. Todos os dias, incluindo finais de semana, fazemos plantão – explicou.

Para ele, ainda que venham juízes titulares para a Comarca de Caçapava, os problemas relativos à morosidade no andamento dos processos não seriam resolvidos por completo.

– A Comarca tem cerca de 15 mil processos, sendo que o número de juízes (dois) e de servidores é insuficiente para atender, de forma célere, toda a demanda. Juízes e servidores trabalham até de noite e em finais de semana e, mesmo assim, não conseguem lidar com o volume de trabalho. E, além do serviço, vale lembrar que juízes e servidores são pessoas, não máquinas, têm família e assuntos particulares a tratar. O ideal seria a criação de mais uma Vara Judicial, mas isso depende de edição de lei pela Assembleia Legislativa, além de recursos materiais e humanos, que são escassos no Poder Judiciário, não se vislumbrando como algo concreto a curto ou médio prazo – declarou.

Diego Locatelli também considera que a pandemia, que causou a suspensão de prazos e de audiências presenciais, e o ataque hacker ao TJRS, que inabilitou os computadores do Poder Judiciário por quase dois meses, contribuíram para a morosidade dos processos.

Conforme o juiz, desde o final de 2019 os processos são distribuídos exclusivamente na forma eletrônica, o que permite despachar e sentenciar de forma remota e todos os dias.

– O cidadão e o advogado que acompanham o Sistema E-proc (sistema eletrônico de processos) veem despachos e sentenças proferidos pelos juízes substitutos em altas horas da noite e durante os finais de semana. Até mesmo os processos físicos, que são os mais antigos, podem ser despachados por forma remota, embora, muitas vezes, tenhamos que levar esses processos para casa para serem analisados e devolvê-los na semana seguinte, quando viermos na Comarca. É certo que uma Vara que atua em regime de substituição não tem o mesmo ritmo de trabalho de uma Vara com juiz titular, pois este se dedica exclusivamente à unidade judiciária. Contudo, é leviano e inverídico afirmar que os juízes substitutos, na medida do humanamente possível, não estão se esforçando ao máximo para prestar a jurisdição aos cidadãos – afirmou Locatelli.

 

Novos titulares podem chegar só ao longo de 2022

 

Ele também disse que, logo após a promoção dos dois juízes titulares da Comarca de Caçapava, foi aberto edital de remoção (transferência), mas nenhum juiz foi habilitado para assumir as Varas locais. Em razão da pandemia, o concurso de juiz foi suspenso e, por isso, também não foi designado nenhum magistrado recém-aprovado para assumir aqui.

– Está previsto um novo edital para os próximos dias, porém, corre o risco de novamente ser frustrado, pois os juízes do concurso mais recente não têm tempo para pedir remoção, os mais antigos estão buscando promoção ou outra Comarca mais perto de suas famílias, além de que o concurso de juiz ainda está em andamento. É possível, portanto, que somente no ano que vem, com o fim do concurso e a posse de novos magistrados, tenhamos juízes titulares da Comarca – avaliou.

Diego Locatelli também informou que nem ele, nem seu colega, o juiz Luis Filipe Lemos, continuarão como substitutos em Caçapava.

– O Dr. Luis Filipe foi promovido à entrância final e passará a atuar na Comarca de Caxias do Sul. Eu responderei pelas duas Varas Judiciais de Dom Pedrito, sendo impossível, do ponto de vista prático, continuar substituindo em Caçapava. A partir de 2022, até que venham novos juízes titulares, outros juízes serão designados para atuar na Comarca – finalizou.

Fotos: arquivo Gazeta