Desde o início de 2020, o mundo convive com a sombra da Covid-19. Os primeiros casos da doença apareceram ainda no final de 2019 em Wuhan, na China, e, neste ano, o vírus se alastrou pelos outros países. Alguns, inclusive, enfrentam a segunda onda de contágio; outros, como a Espanha, já falam em uma terceira e tentam evitá-la.

Com tudo isso, surge uma dúvida na população: posso contrair Covid-19 mais de uma vez? Em novembro, o Palmeiras informou que o atleta Gustavo Scarpa e três funcionários do clube haviam testado positivo para a doença pela segunda vez. O jogador teve o primeiro diagnóstico positivo confirmado antes do retorno aos treinamentos após a suspensão das partidas de futebol em março. Também no mês de novembro, a jogadora Marta foi cortada da convocatória para os amistosos da Seleção Brasileira contra o Equador por testar positivo pela segunda vez. Em vídeo compartilhado em seu Instagram, Marta se disse surpresa com o diagnóstico, pois já havia tido a doença em junho deste ano. Além disso, o Ministério da Saúde investiga alguns casos de reinfecção em profissionais da saúde, tendo confirmado um deles na quinta-feira, dia 10. Trata-se de uma mulher de 37 anos que atua no Rio Grande do Norte e na Paraíba e teve diagnóstico confirmado em junho e outubro.

Para falar sobre o assunto, a Gazeta entrevistou o farmacêutico bioquímico pós-graduado em Biologia Molecular e diretor técnico do Laboratório Saretta, Alexandre Nabaes Ferreira. Confira:

  1. O que é uma reinfecção?

É quando um indivíduo tem uma determinada doença infecciosa e, depois de curado, volta a ser contaminado em um período de 90 dias com o mesmo microrganismo.

  1. O que é preciso para atestar um caso de reinfecção de Covid-19? Existe um protocolo padrão para saber se, de fato, se trata de um caso de reinfecção?

Sim. Uma das exigências para a comprovação é que, quando há a primeira infecção, sejam feitos exames mais complexos para saber o sequenciamento do vírus, para poder comparar em uma segunda infecção. Só o resultado positivo para Covid-19 em um exame não descreve a sua identidade genética, que contém os dados que serão comparados num futuro.  Por isso, em grandes centros, as amostras são armazenadas para um futuro estudo.

  1. O que já se sabe sobre esses episódios duplicados de Covid-19? Eles podem influenciar a segunda onda de casos ou a eficácia das vacinas?

Reinfecção, em viroses, não é muito comum, mas acontecem por alguns motivos, como baixa imunidade, mutações do vírus, alta exposição à carga viral e predisposições genéticas do indivíduo infectado. Até então, são muito raros os casos e muitos ainda não tiveram conclusão científica pela falta de dados da primeira amostra ou falsos resultados positivos devido à baixa qualidade dos exames utilizados. O certo é que vamos ter que aguardar se vai aparecer mais casos comprovados para ter certeza e avaliar a incidência de reinfecção, pois, até o momento é muito rara.

  1. Isso acende um alerta sobre o tempo que o indivíduo fica, de fato, imune à Covid-19 após se recuperar da doença. Por quanto tempo a pessoa mantém os anticorpos do vírus no organismo?

Desde o início da pandemia, se sabe que nem todos os infectados vão produzir anticorpos protetores para a Covid-19, o que também não quer dizer que estas pessoas vão ficar desprotegidas. A maioria que já teve a doença e não produz anticorpos dificilmente se reinfecta. São vários os estudos observacionais que dizem que os anticorpos produzidos no organismo permanecem circulando no sangue por um período de três a seis meses na maioria das pessoas, portanto, como acontece com outras viroses respiratórias, as vacinas vão ter que ser periódicas para imunizar contra a Covid-19.

  1. Qual a importância de que mesmo as pessoas que já tiveram o vírus continuem se cuidando?

Quando as pessoas frequentam vários ambientes com outras pessoas, elas podem carregar a vírus sem se infectar, mas transportá-lo para outros e, assim, mesmo imunes, há uma possibilidade de transmissão. Por isso, uma pessoa que já teve a doença deve, por precaução, continuar usando máscara.

  1. Há estudos que relatam que essa reinfecção se daria pela mutação do vírus. Sendo assim, a pessoa não estaria sendo reinfectada pelo mesmo vírus, mas sim por uma mutação dele. O Sars-CoV-2 muta frequentemente?

Este vírus já possui várias mutações, e isto prejudica as pesquisas por medicamentos e vacinas. Mas o inimigo é o mesmo. As mutações mudam a características da estrutura dele, o que confere diferentes padrões de infecção e até de poder de infecção.

  1. As mutações aumentam as chances de reinfecção?

Sim, pois a mutação pode driblar um sistema imunológico que reconhece uma estrutura viral e, quando aparecem modificações importantes nesta estrutura, nosso sistema imunológico não a reconhece para se defender de imediato.

  1. Com as mutações, o vírus é transmitido mais facilmente? Elas tornam o vírus mais perigoso?

As mutações são o que mantém o vírus mais tempo no ambiente, pois tentam protegê-lo do sistema imunológico das pessoas. Mas nem sempre as mutações são eficazes ao vírus ou têm o poder de mudar suas características de infecção. Isto já foi estudado em outras viroses e parece que também é o que está se repetindo com este coronavírus. O que se tem observado é que, desde que ele apareceu na China até hoje, espalhado pelo mundo. ele sofreu várias alterações e estas melhoraram o poder de entrada e de fixação do vírus na célula, mas não aumentaram seu poder de letalidade.

  1. Qual o principal alerta que você deixa para a população de Caçapava?

Penso que as pessoas devem continuar atentas e praticando o bom convívio social. Informações preventivas, todos já estão sabendo, e é farta a informação nos meios de comunicações. As pessoas têm que entender que, enquanto não houver uma vacina eficaz e disponível a todos, este vírus vai se manter circulando. E é lógico que agora, com a atividade econômica tentando voltar ao normal, os casos aumentem, mas também não podemos ficar em casa escondidos, travando a economia e esperando que o governo nos traga o sustento. A vacina pode demorar e as consequências podem ser bem piores para o município. Por tudo que aprendemos, devemos voltar às atividades respeitando os distanciamentos e manter os lugares ventilados. As pessoas com sintomas devem procurar imediatamente o serviço de saúde para saber se preenchem os requisitos para serem isoladas (evitar decisões sem respaldo médico). Práticas esportivas, passeios ao ar livre e tomar sol são atividades recomendadas. Crianças e adolescentes, nesta pandemia, são os mais prejudicados. Estudos indicam o menor percentual de infecção nesta fase, casos letais são raríssimos, portanto poderiam estar frequentando aulas e parques, mas dependem da estrutura familiar e com quem dividem a casa, pois podem transportar o vírus. Penso que, neste caso, os pais deveriam ser os avalistas para a circulação dos jovens. Em tempo, não compartilhe copos, talheres, objetos de uso pessoal e, principalmente, o chimarrão. Muitos casos em nossa cidade se originaram deste descuido.